O filme Coração de Lutador

Vamos ser francos: Dwayne Johnson já não tem mais nada a provar. Ele é uma das mais relevantes lendas do WWE e ainda é venerado sempre que fala em aparições especiais, estrela de séries de ação e aventura, com mais de 390 milhões de fãs (só no Instagram), empreendedor, ícone publicitário... uma das figuras mais famosas do momento. O que poderia faltar para alguém assim? A jornada de The Rock em Coração de Lutador, um drama sobre o lutador de artes marciais Mark Kerr, está intimamente ligada ao biografado da narrativa.

Durante a estreia do filme da A24 no Festival de Toronto, Kerr observou que, agora, um indivíduo que é conhecido globalmente está trazendo sua trajetória para as telas. A própria obra se empenha em mencionar seu nome e sobrenome repetidamente. Coração de Lutador, dirigido por Benny Safdie, narra uma trama sobre reconhecimento, a busca por se sentir inteiro e a importância da camaradagem. Embora esses aspectos sejam comuns em filmes esportivos, vale ressaltar que nem todos conseguem abordar temas tradicionais de maneira apropriada. No entanto, isso não se aplica a The Smashing Machine - título original que alude ao apelido de Kerr nos ringues.

Safdie, que estreitamente colabora pela primeira vez sem o irmão Josh, adota um estilo documental para retratar o cotidiano de Kerr (Johnson) em sua luta para permanecer resistente tanto nos ringues quanto fora deles. Lutando contra o vício em opióides, ele tem uma relação problemática com Dawn (Emily Blunt) e um torneio especial do Pride, um evento de luta livre bastante popular nos anos 2000, pode ser um ponto de virada em sua trajetória profissional.

O diretor posiciona a câmera de maneira que pareça estar espiando as interações entre Mark e Dawn, incluindo seus treinos e os momentos que antecedem e se seguem às lutadas. Safdie opta por alguns takes longos que acrescentam um toque ainda mais autêntico à cena. Um dos momentos mais marcantes é aquele em que a câmera acompanha Johnson logo após uma luta. Ela segue o lutador desde o ringue até a saída do ginásio, onde ele conversa com os supervisores da luta, depois no elevador e no vestiário, onde finalmente capturamos sua reação após o resultado.

Dwayne Johnson oferece sua melhor performance neste filme. Assim como o personagem de Kerr, que aspira a brilhar nos ringues, essa atuação já está sendo reconhecida e certamente será lembrada durante a temporada de premiações.

O trabalho é fisicamente exigente, e Safdie compreende como capturar cada pormenor, cada músculo e a pele suada de seu protagonista de maneira a intensificar o drama. Além disso, não é comum ver The Rock usando uma sunga da Bad Boy – sério! Disfarçado com próteses no rosto e nas orelhas, Johnson altera seu tom de voz, sua maneira de se mover e assume uma personalidade vulnerável, quase ingênua, que contrasta fortemente com a imagem de The Rock que temos da WWE, das suas redes sociais ou do personagem durão que ele costuma interpretar em seus filmes.

O ator tem seu grande momento de emoção que poderia ser enviado à Academia, mas também apresenta outros momentos mais sutis, exaltados pela surpreendente atuação de Ryan Bader, ex-lutador do UFC, que tem potencial na atuação. Idêntica observação se aplica a Emily Blunt, que, assim como Johnson, também modifica sua voz para dar vida a Dawn, expressando suas angústias e um dos aspectos mais dramáticos da história.

Coração de Lutador não traz uma luta grandiosa, no estilo de Rocky contra Apollo. O filme se destaca nas interações mais pessoais, como quando Kerr apoia seu treinador que enfrenta dores futuras, ou quando o lutador indaga um funcionário do parque de diversões sobre uma atração, pois ele fica enjoado com muitos giros.

Tudo isso é eficaz devido à autenticidade que Dwayne Johnson exibe ao mergulhar nessa narrativa. É a evidência que ele precisa para ser reconhecido, feita de forma justa e respeitosa. Ao final, se você decidiu assistir Coração de Lutador para ver The Rock em um papel sério, terminará conhecendo Mark Kerr, o ex-lutador que foi interpretado por Dwayne Johnson em sua performance mais significativa.