Guerra que se seguiu à fundação do Estado de Israel, há 70 anos, teve consequências dramáticas para a população árabe que vivia na região: mais de 700 mil pessoas perderam tudo o que tinham.
No verão setentrional de 1948, as pessoas que em maio haviam perdido seus lares com a fundação do Estado de Israel vagavam em filas intermináveis pela região, amontoadas em caminhões, montadas sobre burros e cavalos ou a pé.
A Nakba – "catástrofe", como os palestinos chamam os acontecimentos que se seguiram à fundação de Israel – já se anunciava há tempos. Mais de 30 anos antes, em 2 de novembro de 1917, o ministro britânico do Exterior, Arthur James Balfour, enviara uma carta ao presidente da Federação Sionista Britânica, Lionel Walter Rothschild. A Declaração de Balfour, como o texto ficou conhecido, afirmava que o Reino Unido iria considerar com benevolência e promover a criação de uma pátria para o povo judeu.
Antes, cada vez mais judeus do Leste Europeu haviam ido para a Palestina, fugindo dos pogroms, os ataques antissemitas de larga escala. Entre 1882 e 1939, foram cerca de 380 mil. Eles chegaram a uma terra que já tinha 450 mil habitantes em 1882. Destes, 90% eram árabes muçulmanos.
Árabes se sentem ameaçados
A partir da década de 1920, as tensões causadas por essa imigração aumentaram. Logo, dois movimentos nacionais se opunham, o judeu-sionista de um lado, e o palestino do outro. Os árabes se sentiam cada vez mais ameaçados de perder espaço – um sentimento que culminou num primeiro levante, entre 1936 e 1939.
Para diminuir as tensões, a partir de 1939 o Reino Unido restringiu a chegada de judeus, apesar da situação de crise provocada pela Alemanha nazista. Em resposta, vários grupos sionistas se revoltaram contra o Mandato Britânico da Palestina. Em 1942, seus representantes reivindicaram a fundação de um Estado judaico após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Depois de 1945 – os nazistas haviam assassinado cerca de 6 milhões de judeus europeus –, as tensões continuaram. O Reino Unido solicitou a mediação das Nações Unidas, que, em novembro de 1947, decidiu dividir a Palestina. O estado judaico compreendia 57% do território; o Estado árabe, os 43% restantes.
Guerra após a fundação do Estado
Em 14 de maio de 1948, o ministro do governo provisório, David Ben Gurion, leu a proclamação de independência do novo Estado de Israel. Pouco depois começava uma guerra entre israelenses e árabes. De um lado estavam cinco Estados árabes: Egito, Iraque, Jordânia, Líbano e Síria. Do outro lado, os israelenses. Estes consideraram que, com a eclosão dos combates, as demarcações acordadas não eram mais válidas. A guerra só terminou no ano seguinte, após vários tratados de paz.
Para os habitantes árabes da região, a guerra foi uma catástrofe. Eles estiveram em desvantagem em relação aos combatentes sionistas desde o início, segundo o escritor palestino Sari Nusseibeh, um dos grandes defensores do entendimento entre israelenses e palestinos. Ele afirma, em seu livro de memórias Once upon a country: a palestinian life ("Era uma vez um país: uma vida palestina") que os sionistas formavam "um exército de espírito espartano, endurecido pelos horrores da Europa".
"Além disso, eles estavam muito melhor equipados que os árabes, com um vasto arsenal de armas contrabandeadas da Europa ou roubadas dos britânicos durante a guerra. Em pequenas oficinas foram produzidos veículos blindados, morteiros e granadas", escreve.
Inúmeras pessoas tiveram de fugir das áreas agora controladas por Israel, um total de 531 aldeias foi destruído, na sua maioria de forma planejada e deliberada, para impedir que os árabes pudessem viver nesses locais. Em cidades como Tel Aviv, Jaffa, Haifa e Jerusalém quase não residiam mais árabes. No campo e na cidade, colonos judeus ocuparam a terra dos refugiados.
"Juntamente com toda a Palestina, a cosmopolita Jerusalém entrou na guerra civil", relata Nusseibeh. "Professores, médicos e comerciantes de ambos ocuparam posições militares e dispararam contra pessoas que, em outras épocas, eles teriam recebido em suas casas, como convidados. As regras da civilização foram suspensas, dois povos amantes da paz só pensavam em guerra", diz.
Refugiados palestinos
A especialista em Oriente Médio Marlène Schnieper escreve eu seu livro Nakba, die offene Wunde ("Nakba, a ferida aberta") que 750 mil pessoas perderam tudo o que tinham durante os acontecimentos relacionados à fundação do Estado de Israel. Esse é o número registrado pela Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) quando esta começou seus trabalhos, em 1950.
As consequências desse êxodo em massa não foram resolvidas até hoje: "Com seus filhos e netos, os refugiados de então se tornaram 5 milhões", escreve Schnieper. E o número continua a aumentar. De lá para cá, os refugiados palestinos registrados vivem em campos oficialmente reconhecidos no Líbano, Jordânia e Síria, bem como na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental. Muitos levaram consigo as chaves de suas casas na época da fuga. Hoje, elas representam a esperança de retorno dos palestinos.
O conflito entre árabes e israelenses não foi resolvido até hoje. Os dois lados se enfrentaram em várias guerras. Entre as que tiveram maiores consequências está a chamada Guerra dos Seis Dias, de 1967. Israel repeliu uma série de ataques coordenados das Forças Armadas de Egito, Síria e Jordânia. Como resultado, o país ocupou a Faixa de Gaza, a Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, e partes da Península do Sinai.
Conflito não resolvido
Como consequência da guerra de 1967, Israel começou a construir assentamentos na Cisjordânia. A resistência a assentamentos legalmente não reconhecidos pela ONU levou a duas grandes revoltas: a Primeira (1987-1993) e a Segunda Intifadas (2000-2005). Os palestinos, militarmente em posição claramente desfavorável, apostaram sobretudo no terrorismo, incluindo atentados suicidas no transporte público. Os israelenses exerceram enorme pressão através de suas forças de segurança. Um dos seus meios mais controversos foi a destruição das casas de terroristas suicidas.
Passados 70 anos, o território que os palestinos almejam para o seu Estado mal chega a 25% da Palestina histórica. E, diante da atual situação na região, é possível que eles jamais consigam tudo isso – se é que um dia haverá um Estado palestino.
Fonte DW